Transcrevi, no post anterior, meu primeiro conto: O outro. Chamei-o de miniconto pretensioso, mas estava errado. Trata-se, apenas, de um conto pequeno e pretensioso. Um miniconto é uma espécie literária distinta, soube agora há pouco.
Para maiores esclarecimentos:
"Fui ao Celebration e me disseram que foi muito bom!"
Talvez isso seja um miniconto!
Para compensar, transcrevo, abaixo (copio e colo, claro), um dos meus textos favoritos:
Seria um conto?"ÁGUA DO MAR
Estamos aqui novamente – foi o que ele disse a si mesmo, em silêncio, antes de pisar, descalço, a fina areia da praia.
Mesmo estando o dia nublado, ainda era domingo, e ele ansiava por molhar seus pés na água salgada, seu solitário ritual de purificação. Não lembrava há quanto tempo fazia isso, mas sentia que não poderia deixar de procurar aquela paz.
Às vezes, passava muito tempo sem ter essa necessidade, chegando mesmo a quase se esquecer dela. Noutras épocas, buscava seu alívio com mais freqüência. Somente assim sentia-se novamente em si. Era como uma recarga espiritual, muito embora jamais tentasse explicar. É provável que nunca tenha ouvido falar em catarse, ou idéias do gênero. Conhecia pouco dessas coisas.
Rui era um homem quase maduro. Perdera, em parte, o verniz com que a juventude costumava banhar sua face, mas ainda não adquirira as marcas trazidas pelas convicções da meia-idade.
Gostava de frases feitas, frases de efeito moral, frases com estilo. Era esse o seu manancial de soluções para as questões que julgava elevadas. Citava-as sempre, anotava-as em todos os lugares, decorava-as, sabia de seus autores, de suas vidas. Aproveitava-se da experiência sintetizada por outros homens, acreditando que assim poderia igualar-se a eles.
Sempre procurava o mar quando algo diferente acontecia em sua vida. Uma conquista alcançada, uma derrota sentida, seu encantamento e desencantamento pelo mundo, a ventura e a desventura de viver. Compartilhava com o oceano suas dúvidas mais íntimas, oferecendo, como que em retribuição, suas poucas certezas.
Mas nada disso estava muito bem organizado na sua cabeça. Agia mais por instinto do que por deliberação. As únicas coisas que dominava eram seus passos, excessivamente lentos, e seu olhar, fixado na linha do horizonte. Todo o resto era construído com espontaneidade, sem o seu controle ou orientação.
Esse dia, a princípio, não tinha nada de diferente dos outros. Caminhada, reflexão, retorno e paz. Rui lembrou de amigos que tinham ido para sempre, alguns por vontade própria. Lembrou que, ele próprio, já tinha tido vontade de abreviar o que considerava ser “sua estada acidental”. Talvez nem essa expressão fosse sua.
Ao retornar, satisfeito e renovado, quis, pela primeira vez, uma definição para esse contato consigo mesmo. Vasculhou sua memória, consultou as frases que usava por empréstimo. Não encontrou nada.
Percebeu, então, que esse era o único momento em que ouvia suas próprias idéias. Sentiu a liberdade que essa constatação lhe concedia, sentiu que poderia expandir seus horizontes, de dentro para fora, a partir de si mesmo. Viu, então, que o que vinha de fora apenas o restringia, limitando-o a pensamentos que não eram seus.
Quis sorrir, mas a única coisa que conseguiu fazer foi enxugar a segunda lágrima, pois a primeira já tinha lhe lembrado, com seu sabor, que seu caminho beirava o mar.
Assim prosseguiu, ainda com sal nos pés e na boca, cada vez com menos certezas, mas cada vez mais puro e perto de si."
Estamos aqui novamente – foi o que ele disse a si mesmo, em silêncio, antes de pisar, descalço, a fina areia da praia.
Mesmo estando o dia nublado, ainda era domingo, e ele ansiava por molhar seus pés na água salgada, seu solitário ritual de purificação. Não lembrava há quanto tempo fazia isso, mas sentia que não poderia deixar de procurar aquela paz.
Às vezes, passava muito tempo sem ter essa necessidade, chegando mesmo a quase se esquecer dela. Noutras épocas, buscava seu alívio com mais freqüência. Somente assim sentia-se novamente em si. Era como uma recarga espiritual, muito embora jamais tentasse explicar. É provável que nunca tenha ouvido falar em catarse, ou idéias do gênero. Conhecia pouco dessas coisas.
Rui era um homem quase maduro. Perdera, em parte, o verniz com que a juventude costumava banhar sua face, mas ainda não adquirira as marcas trazidas pelas convicções da meia-idade.
Gostava de frases feitas, frases de efeito moral, frases com estilo. Era esse o seu manancial de soluções para as questões que julgava elevadas. Citava-as sempre, anotava-as em todos os lugares, decorava-as, sabia de seus autores, de suas vidas. Aproveitava-se da experiência sintetizada por outros homens, acreditando que assim poderia igualar-se a eles.
Sempre procurava o mar quando algo diferente acontecia em sua vida. Uma conquista alcançada, uma derrota sentida, seu encantamento e desencantamento pelo mundo, a ventura e a desventura de viver. Compartilhava com o oceano suas dúvidas mais íntimas, oferecendo, como que em retribuição, suas poucas certezas.
Mas nada disso estava muito bem organizado na sua cabeça. Agia mais por instinto do que por deliberação. As únicas coisas que dominava eram seus passos, excessivamente lentos, e seu olhar, fixado na linha do horizonte. Todo o resto era construído com espontaneidade, sem o seu controle ou orientação.
Esse dia, a princípio, não tinha nada de diferente dos outros. Caminhada, reflexão, retorno e paz. Rui lembrou de amigos que tinham ido para sempre, alguns por vontade própria. Lembrou que, ele próprio, já tinha tido vontade de abreviar o que considerava ser “sua estada acidental”. Talvez nem essa expressão fosse sua.
Ao retornar, satisfeito e renovado, quis, pela primeira vez, uma definição para esse contato consigo mesmo. Vasculhou sua memória, consultou as frases que usava por empréstimo. Não encontrou nada.
Percebeu, então, que esse era o único momento em que ouvia suas próprias idéias. Sentiu a liberdade que essa constatação lhe concedia, sentiu que poderia expandir seus horizontes, de dentro para fora, a partir de si mesmo. Viu, então, que o que vinha de fora apenas o restringia, limitando-o a pensamentos que não eram seus.
Quis sorrir, mas a única coisa que conseguiu fazer foi enxugar a segunda lágrima, pois a primeira já tinha lhe lembrado, com seu sabor, que seu caminho beirava o mar.
Assim prosseguiu, ainda com sal nos pés e na boca, cada vez com menos certezas, mas cada vez mais puro e perto de si."
Em julho de 2002.
No primeiro domingo à noite, após a criação deste blog, por ironia, não postei!
Em compensação, comi pizza. Pedi para seis pessoas, mas apareceram oito!
Quanto ao vinho, eu não ia dizer, mas...
O tal Bordeaux Grand Theatre 2006 (tinto, français, Cabernet Sauvignon e Merlot), a despeito da recomendação (disseram que era "redondinho") não estava lá esses balaios (isso ainda na sexta!), razão pela qual comecei repetindo o Tribal sul-africano (Pinotage e Pinot Noir). Para um vinho do dia-a-dia tem um bom custo-benefício. Parece que saiu alguma coisa em relação a ele na revista Veja.
Depois as coisas começaram a melhorar e vieram um Winemaker (chileno) e um Norton (argentino). As uvas e o ano não importam agora, pois esses são sempre garantidos.
Antes de dormir no domingo e, na segunda-feira, ao acordar, estava tocando Led Zeppelin:
STAIRWAY TO HEAVENThere's a lady who's sure all that glitters is gold
And she's buying a stairway to heaven
And when she gets there she knows if the stores are all closed
With a word she can get what she came for
Woe,
And she's buying a stairway to heaven
There's a sign on the wall but she wants to be sure
'Cause you know sometimes words have two meanings
In the tree by the brook there's a songbird who sings
Sometimes all of our thoughts are misgiven
Woe,
And it makes me wonder
There's a feeling I get when I look to the west
And my spirit is crying for leaving
In my thoughts I have seen rings of smoke through the trees
And the voices of those who stand looking
Woe,
And it makes me wonder
And it's whispered that soon, if we all call the tune
Then the piper will lead us to reason
And a new day will dawn for those who stand long
And the forest will echode with laughter
If there's a bustle in your hedgerow
Don't be alarmed now
It's just a spring clean for the May Queen
Yes there are two paths you can go by
But in the long run
There's still time to change the road you're on
And it makes me wonder
Your head is humming and it won't go because you don't know
The piper's calling you to join him
Dear lady can't you hear the wind blow and did you know
Your stairway lies on the whispering wind
And as we wind on down the road
Our shadows taller than our souls
There walks a lady we all know
Who shines white light and wants to show
How everything still turns to gold
And if you listen very hard
The tune will come to you at last
When all are one and one is all
To be a rock and not to roll
Woe oh oh oh oh oh
And she's buying a stairway to heaven
LED ZEPPELIN
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