Esse texto é bem antigo e algo ingênuo. Gosto dele, apesar de não mais fazer tanto sentido quanto há onze anos.
É isso mesmo... o tempo passa, parece que o escrevi ontem.
Lendo-o novamente, agora, antes de postar, percebo que foi muito importante como experiência. Atribui-se a Mathias Aires a máxima de que a vaidade das letras seria maior do que a vaidade das armas.
Quem sou eu para discordar?
"APERTO DE MÃOS
O aperto de mãos é um hábito tão comum e tão antigo na cultura ocidental que desafio a qualquer um revelar quando apertou pela primeira vez a mão de outra pessoa. Difícil é passarmos um dia inteiro sem apertarmos uma mão alheia.
O aperto de mãos é um hábito tão comum e tão antigo na cultura ocidental que desafio a qualquer um revelar quando apertou pela primeira vez a mão de outra pessoa. Difícil é passarmos um dia inteiro sem apertarmos uma mão alheia.
As mãos são apertadas de imediato assim que encontramos alguém conhecido, bem como o ato é repetido na despedida. Apertamos as mãos para confirmar um negócio fechado ou para garantir a palavra, como forma de inspirar confiança a quem deseja confidenciar algo. Quando se é apresentado a alguém, o aperto de mãos é providência automática.
Todos nós sabemos que um aperto de mãos pode revelar muito da pessoa com a qual estamos em contato. Longe de nós a pretensão de uma análise psicológica, mas quem nunca apertou aquela mão que parece não querer ter sido tocada por você? Estamos falando daquela mão flácida e escorregadia, que não consegue disfarçar o constrangimento da obrigação.
Que diferença do aperto de uma mão firme, dando aquela impressão de segurança e honestidade! Melhor ainda quando a mão esquerda vem em auxílio da direita, para dar mais calor e demonstrar grande consideração.
Há aqueles que apertam com tamanha restrição, que só chegam a tocar as pontas dos dedos, como se estivessem pegando em algo que não presta, como diz um amigo meu.
Existe ainda o aperto relâmpago, exigência imposta pelo corre-corre do dia-a-dia, onde nota-se claramente que está faltando alguma coisa.
Ainda sobre apertos rápidos, temos presenciado e sofrido apertos daquela espécie em que é a próxima mão a que se queria apertar. Explico. Quando se está numa posição geográfica de antecedência a alguém mais importante, os apertadores cumprem a formalidade com tanta celeridade, e sem a menor satisfação, que é inevitável sequer lembrar que o ato ocorreu.
Temos o aperto prolongado, que na maioria das vezes indica satisfação e amizade, mas que vez por outra é indesejável, principalmente quando o participante aproveita para manter a conversa da qual estávamos querendo nos livrar, ou nos arrasta por metros, no estilo rebocado pelo chato.
Pior do que apertar uma mão suja é apertar uma mão molhada, pois invariavelmente faz surgir a dúvida a respeito do líquido misterioso.
Ninguém está livre de acabar de lavar as mãos e ser, logo após, obrigado a apertar uma mão que talvez não tenha recebido, há tempos, o benefício da água e do sabão. O inverso ocorre com lamentável freqüência, ou seja, apertarmos uma mão suspeita e ficarmos com uma ânsia urgente de lavarmos a nossa mão.
Vez por outra nos deparamos com aquela mão simplória, que dá uma limpadinha na calça antes de vir a nosso encontro. A manifestação é tida por muitos como reveladora de respeito.
Aquele aperto de mãos que parece querer triturar nossos ossos é indicador infalível de desequilíbrio psicomotor, quando não for proposital e denunciante de animosidade entre as partes.
No aperto de mãos, são as mãos, naturalmente, as peças fundamentais. Temos as mãos gordas, as magras, as grandes, as pequenas, as quentes e as geladas. Há quem não tenha mãos. Com certeza é desnecessário lembrar que a mão que nos interessa no momento é a do braço direito. Entretanto, não raro somos obrigados a apertar mãos esquerdas, fato que tem acontecido quando a direita está ocupada. E quem nunca apertou um braço estendido e dobrado (cotovelo), sob a alegação de que a mão estaria suja?
O momento do ato também é causa de variação. Imaginemos o encontro de dois cavalheiros, possíveis apertadores, num banheiro público, quando um dos participantes acaba de sair do reservado. Apertar ou não apertar? Eis a questão!
Bem, um tópico importante em matéria de inconveniência é aquela mão feminina, quase sempre uma extremidade de cinco pontas de uma mulher feia, levemente flexionada e com a palma voltada para baixo, pedindo para ser beijada; só superada pelo brutamontes que ao apertar a mão da donzela aflita aproveita para puxá-la, a donzela, com a finalidade de aplicar um beijo quase sempre indesejável, mesmo que no rosto.
E a mão não correspondida? Aquela mão que pede para que ninguém tenha visto sua infelicidade, não importando se a mão que a desprezou o fez para demonstrar propositalmente desafeto, ou se o fato se deu por distração da outra parte. Neste último caso é aceita uma nova tentativa.
Tem ainda a mão idiota, que é estendida e depois recua, com a finalidade confessada de fazer graça. Não gostaríamos nem de lembrar, mas ainda existe por aí aquela mão jocosa que aproveita para fazer cócegas.
A “mão-boba”, por ser um tema bastante vasto, é merecedor de atenção especial. Quer por sua grande incidência, quer por suas variações, é mencionada aqui apenas de passagem, como forma de homenagem, sem que desçamos às minúcias que o caso requer.
Essa cerimônia, o aperto de mãos, em virtude do desgaste provocado pela freqüência, tem sido banalizada. Hoje aperta-se qualquer mão, em qualquer lugar, de qualquer maneira. Existem muitas pessoas que conhecemos há anos, sendo nosso único contato físico com elas o aperto de mãos.
As palavras, faladas ou escritas, podem mentir; mas as mãos, dificilmente.
Ao apertar a mão de outrem, inevitavelmente estamos transmitindo um pouco de nós mesmos."
Humberto Pimentel Costa.
Em 1998.
eu adoro esse texto.
ResponderExcluir:***
Fernanda
Meu filho,
ResponderExcluirque texto interessante!Gostei muito, chama a atenção para os significados,você é muito observador,parabens pelo talento de descrever tão bem determinados temas.Beijos da mamãe.
Meu filho,como é bom saber, que uma pessoa vivenciou um momento tão emocionante e significativo, em sua vida de trabalhador.Seu relato foi essencial para as lembranças agradáveis de seu primo Fausto.Parabens a você e a ele pela feliz recordação.Beijos da mamãe.
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